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Pan-Hispanic Ballad Project

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2890:1 O Boi Formoso (polias.)            (ficha no.: 2880)

Versión de Madeira s. l. (dist. Funchal, isla de Madeira, Madeira, reg. Madeira, Portugal).   Recogida por Álvaro Rodrigues de Azevedo, (Colec.: Azevedo, Á. Rodrigues de). Publicada en Azevedo 1880, pp. 273-80. Reeditada en Costa Fontes 1997b, Índice Temático (© HSA: HSMS), pp. 343-345, X23.  224 hemist.  Música registrada.

     ****Era um rico senhor    de mui nobre fidalguia;
  2   grandes honras, muitas terras,    no meio delas vivia.
     Se guerras se pregoavam,    de tudo mais s` esquecia
  4   mas, se não andava em guerra,    ai mulheres, ai vilania:
     a todos ele lograva,    com todos se divertia,
  6   que, no asar de seus jogos,    como senhor, nã perdia.
     Uma quintã ele tinha,    sua coitada baldia.
  8   Dos criados que lá eram    a um mais que todos qu`ria,
     tão fiel, com ser malato,    que nem zombando mentia.
  10   Nos gados que este guardava    um boi bragado havia
     que fizera sete mortes,    que, de bravo, nem dormia:
  12   lo melhor boi da manada,    que seu amo não vendia
     nem por tanto do dinheiro    que la herdade valia.
  14   Pois teve má fim lo boi,    como ninguém cuidaria.
     Um vilão de por `li perto,    que abastado vivia,
  16   só por abastado ser    lo senhor lo acolhia,
     só p`ra chacotear dele,    que p`ra mais lo não queria.
  18   --Vilão ruim, nada vales--    lo fidalgo lhe dizia.
     Esse malato do gado    tem muito maior valia.
  20   Tu mentes por condição,    ele nunca mentiria.
     --Aposto que mentirá    antes que passe outro dia.
  22   --Aposto minha quintã,    mail la coutada baldia,
     que meu malato fiel    a mim não me enganaria.
  24   --Eu aposto quanto tenho;    vamo-lo ver, senhoria.
     --Apostado, apostado,    vamo-lo ver, vilania.--
  26   Lo vilão, todo sanhudo,    a sua casa corria,
     cuidando polo caminho    por que traças ganharia.
  28   E logo que lá chegou,    tudo à mulher dizia:
     --Mulher minha, bem lo vês,    este caso apressado;
  30   vai-me ganhar esta aposta    de lanço afortunado.
     Lo malato da quintã    tem um boi a seu cuidado,
  32   lo melhor boi da manada,    boi que é de cor bragado,
     que fizera sete mortes,    de bravo, sempre acordado,
  34   que seu amo não vendia    por quanto dinheiro contado.
     À quintã vai-me nesta hora    dar conta do meu recado.
  36   Por ti lo malato seja    a modo bem conversado,
     que, morto lo boi, te dê    los chavelhos do bragado.
  38   --Descansa, marido meu,    darei conta do recado;
     de conversa e chavelhos    isso fica a meu cuidado.--
  40   Suas razões bem sabe ela,    por que fal` assegurado:
     malato, quando la via,    olhava imbasbacado.
  42   Ela de lo ver gostava,    por ser bem-posto malato.
     Foi lo marido com ela    `té à quintã ser chegado;
  44   ela pola quintã dentro,    ele p`ra casa voltado.
     Lo malato, que l` avista,    fica de cor demudado:
  46   --Vós, senhora, por aqui,    tão longe de povoado?
     --Venho pedir-t` um favor,    meu malato estimado.
  48   --Que poderei eu fazer    que vos possa ser de grado?
     --Malatinho, eu te peço    los chavelhos do bragado.
  50   --Ai, amor, não pode ser!    É lo melhor boi do gado,
     lo mais qu`rido de meu amo,    e posto a meu cuidado.
  52   --Dize-lhe tu que morreu    de quebranto ou d` olhado.
     --Eu a meu amo nã minto    nem mato lo boi bragado,
  54   que nunca por mim `té `gora    foi meu amo inganado.
     --Malato dos meus pecados,    se queres ser meu amado,
  56   dá-me tu lo qu` eu te peço,    lo que peças terás dado.
     --E s` eu vos pedir, senhora,    lo que quer um namorado?
  58   --Dá-me tu lo que t` eu peço,    que terás lo desejado.--
     Nã passava uma hora,    morto foi lo boi bragado;
  60   lo que despois sucedeu    nã lo sei p`ra ser contado.
     Nã sei dizer lo que foi    nem que tempo foi passado.
  62   Sei qu` ela levou consigo    los chavelhos do bragado,
     e, dando-los ao marido,    deu conta do seu recado:
  64   --Marido de meus pecados,    morto `stá lo boi bragado;
     p`ra tão bons chavelhos teres,    foi trabalho porfiado.
  66   --Mas trabalho, mulher minha,    trabalho bem acabado.
     --Fiz diligência, marido,    dar conta do meu recado.
  68   --Lo malato que nã mente    agora `stá apanhado;
     la verdade nã dirá,    e ganhei lo apostado.--
  70   Entrementes, na quintã,    malato sem sossegar,
     como pecador na culpa    que nã pode resgatar.
  72   --Tenho qu` ir onde meu amo,    a seus mandados tomar;
     mas que lhe vou eu dizer    quando do boi me falar?
  74   Eu digo: "Lo boi morreu    de quebranto ou d` olhar".
     E, pau de conto na mão,    prestes vai a caminhar.
  76   Mas, de pernas a tremer,    passada nã pôde dar.
     --Esta mentira nã presta;    outra melhor hei-d` achar.--
  78   E então tomou do pau,    foi-lo na terra fincar:
     --Faço conta qu` é meu amo,    aqui, em pé, a falar:
  80   "Como `stá meu boi bragado?",    meu amo vem perguntar.
     Eu digo: "Nã sei do boi",    e nada mais vou contar.
  82   Mas esta também nã presta;    outra melhor hei-d` achar.
     Nisto duas voltas deu    e tornou a começar:
  84   "Como `stá meu boi bragado?"    meu amo vem perguntar.
     Eu digo: "Lo boi morreu",    e nada mais vou contar.
  86   Mas esta também nã presta;    outra melhor hei-d` achar.
     E mais duas voltas dando,    ele torn` a começar:
  88   --"Como `stá meu boi bragado?",    meu amo vem perguntar.
     Eu digo: "Cuidai, meu amo,    (não será falso cuidar)
  90   que boa moça me veio    com seus incantos tentar.
     Que, se do boi los chavelhos    eu ali lhe fosse dar,
  92   de tudo qu` eu lhe pedisse    nada m` havera negar.
     E, meu amo, dizei cá,    fora-vos ela rogar
  94   quantos chavelhos de boi    lhe mandaríeis vós dar?"
     Esta, sim, boa resposta,    sem à verdade faltar.
  96   E, pau de conto na mão,    malato a caminhar.
     Quando lo bom do malato    portão do amo entrava,
  98   já lo ruim do vilão    já de mais cedo lá `stava.
     E, todo el` alegria,    escondido lo `sperava.
  100   Seu amo, sem mal cuidar,    também por ali andava,
     e quando lo vê pergunta    boi bragado como `stava.
  102   Lo malato respondeu,    lo vilão a escuitar:
     --Cuidai vós, senhor meu amo,    e não é falso cuidar,
  104   que boa moça me veio    com seus incantos tentar.
     Que, se do boi los chavelhos    eu ali lhe fosse dar,
  106   de tudo qu` eu lhe pedisse    nada m` havera negar.
     E, meu amo, dizei cá,    fora-vos ela rogar,
  108   quantos chavelhos de boi    vós lhe mandaríeis dar?
     --Daria, mais que daria!    Nã precisa perguntar.
  110   Lo fidalgo, respondendo,    redobrava a gargalhar.
     Mas lo mau vilão ruim    do malato praguejava;
  112   a troco dos bens perdidos,    com dois chavelhos ficava.

Nota: ****Se trata de una imitación del estilo popular. Véase A[arne]T[hompson] 889.

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