Pan-Hispanic Ballad Project

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0470:3 Ricardo soldado francés (estróf.)            (ficha no.: 4421)

Versión de Vitória (Santo Espírito, Brasil).   Recitada por Manoel Alves Miranda. Recogida por Guilherme Santos Neves, 00/00/1952 (Colec.: Santos Neves). Publicada en Santos Neves 1983, Romanceiro Capixaba, pp. 63-68.  185 hemist.  Música registrada.

     Era un soldado francês    que se chamava Ricardo,
  2   jogador de profissão,    que nunca foi numa parte
     que não trouxesse no bolso    o resultado das cartas.
  4   Os franceses nesse tempo    tinham por obrigação
     de, o militar ou civil,    seguir a religião.
  6   O Papa deitava lei,    ficava em circulação.
     Ricardo, soldado velho,    com trintanos de tarimba,
  8   aonde achava jogo,    ou de lasquim o marimba,
     dizia logo: --Vou ver    água na minha cacimba.--
  10   Un dia faltou-lhe o soldo,    pôs-se Ricardo a pensar
     aonde podia haver jogo    que ele pudesse jogar.
  12   Era domingo, e a misa    não havia de tardar.
     Tocou chamada da missa,    veio o sargento buscá-lo.
  14   Ricardo pediu a ele    se podia dispensá-lo.
     Porém lhe disse o sargento:    --Sou obrigado a mandá-lo.--
  16   Ricardo foi para a missa    com grande constrangimento,
     pois era obrigado a cumprir    a lei do seu regimento,
  18   el dele não afastava    o jogo do pensamento.
     O soldado na igreja    chegando se ajoelhou,
  20   trazia no bolso da blusa    um baralho que tirou.
     Encamaçando as cartas,    uma patota formou.
  22   Não viu que ali por detrás    tinha o sargento ajoelhado.
     O sargento observou    tudo ali que foi passado;
  24   lhe disse depois da missa:    --Você está preso, soldado!--
     Efetuando a prisão    saiu no mesmo instante,
  26   levando o soldado preso    à casa do comandante.
     Disse: --Pronto senhor comandante,    aqui está preso um soldado
  28   que foi ao templo ouvir missa,    estava lá ajoelhado,
     encamaçando um baralho    que tem no bolso guardado.--
  30   Perguntou-lhe o comandante:    --Quem lhe deu esta criação?
     Disse Ricardo: --Senhor,    se ouvir minha razão,
  32   lhe direi até o fim    que há motivo para esta ação.--
     Perguntou-lhe o comandante:
  34   --Que motivo tem você,    sabendo que é proibido?
     Ignora que o jogo    no exército é abolido?--
  36   Disse Ricardo: --Meu jogo    muda muito de sentido.
     --Muda de sentido, como?    Disse Ricardo: --Eu direi.
  38   --Então explique como é,    que eu agora lhe ouvirei.
     Depois de sua explicação,    ou solto ou castigarei.-
  40   --É preciso eu confessar    que eu ganho um soldo mesquinho,
     que este soldo não dá    para mim comprar um livro
  42   para na missa eu rezar.
     Por isto compro um baralho    e rezo nele constante.
  44   --Como se reza em baralho?--    perguntou-lhe comandante.
     --Desde a Escritura Velha    e da Nova, assim por diante.--
  46   Falou-lhe o comandante:    --Você vem errado a mim.--
     Disse Ricardo: --Eu explico    do princípio até o fim.
  4   --Como é esta oração?--    Disse Ricardo: --É assim:
     por exemplo, a carta as,    que tem um ponto somente,
  50   faz recordar que existe    um só Deus onimpotente;
     quando chamamos por Ele,    o encontramos presente.
  52   Quando eu pego em dois de ouro,    ali me predito eu
     que em duas tábuas de pedra    o Criador escreveu.
  54   Quando eu pego em três de ouro,    me recorda a Divinidade,
     por exemplo, as três pessoas    da Santíssima Trinidade.
  56   Como todos conhecemos,    é o espírito, o filho, o pai.
     O quatro me faz lembrar    das quatro Marias de Nazaré,
  58   sendo Maria Afra    e Maria Salomé,
     Madalena e a Virgem pura,    esposa de São José.
  60   No cinco me faz lembrar    daquele dias de fé,
     as cinco chagas de Cristo    feitas por mãos de cruel,
  62   que matou o Crucificado,    o filho de Deus de Israel.
     Quando eu pego o seis de ouro,    faço mil preditação:
  64   seis dias o senhor gastou    na obra da criação.
     Fes tudo isto que existe    sem em nada pôr a mão.
  66   O sete me faz lembrar    da hora negra, triste, amargurada,
     foi os sete passos de Cristo    na sua paixão sagrada.
  68   Com sete espadas de dor    as mãos de Deus foi cravada.
     Nos oito eu vejo as pessoas    que do dilúvio escaparam:
  70   Noé e a mulher e três filhos    e três noras se varam,
     o resto as águas cobriu,    onde todos se afogaram.
  72   Quando eu pego nos nove,    me vem na imaginação
     foi os nove meses ditosos    da virgínia encarnação
  74   que Jesus passou no ventre    da Virgem da Conceição.
     Quando eu pego nos dez,    não posso ali me esquecer:
  76   dez mandamentos ficaram    para o mundo se reger,
     e estes dez se encerra em dois    como todo mundo vê.
  78   Quando eu pego no rei,    me lembra o Rei da Glória
     foi o ente mais poderoso    que já vimos na historia,
  80   que não precisa soldado    para ganhar as vitórias.
     Quando eu pego na sota,    me lembra logo daquela
  82   que toda Jerusalém    enriqueceu só com ela;
     doi aquela que deu à luz    ficando a mesma donzela.
  84   Eis aí, meu comandante,    a razão do seu soldado,
     que eu ganho um soldo mesquinho,    meu soldo é muito esmirrado.
  86   Por isto compro um baralho    que só me custa um cruzado.
     --Ricardo, falaste em todas cartas,    e no valete não falaste?
  88   Não é carta como as outras?    Foi porque não te lembraste?
     --Eu não falei no valete    porque é uma carta ruim;
  90   quando eu compro um baralho,    tiro ela e dou-lhe fim.
     Tem traços desse sargento    que denunciou de mim.
  92                                 --Ricardo, tu sois passado,
     tem vinte anos de praça,    foi tempo bem empregado;
  94   eu te passar a sargento,    vou dar o teu soldo dobrado.--

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0470:2 Ricardo soldado francés (estróf.)            (ficha no.: 3188)

Versión de Guadarranque (ay. San Roque, p.j. San Roque, comc. Campo de Gibraltar, Cádiz, España).   Recitada por Isabel Tirado Pérez (54a). Recogida por Francisco Vegara Giménez y Carmen Tizón, 00/00/1985 publicada en Ruiz Fernández 1995b, La tradición oral del Campo de Gibraltar, nº I. 60.  020 hemist.  Música registrada.

     Estando un soldado en misa    con los naipe(s) entretenido,
  2   le ha regañado el sargento,    se ha hecho el entretenido.
     --En vista que usted me riñe,    también me quiere pegar,
  4   los names de la baraja    yo se los voy a contar;
     dándole en principio al juego,    empecemos por el as
  6   que es un sólo Dios inmenso,    con ése no pué haber más.
     El dos lo considero    como dos perlas preciosas
  8   donde Cristo puso el pie    para subir a la Gloria.
     . . . . . . . . . . . . . . . . . . .    . . . . . . . . . . . . . . . . . . .
     El siete lo considero    que son los siete dolores
  10   que pasó la Virgen Pura    por nosotros pecadores.

Título original: La baraja.

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0470:1 Ricardo soldado francés (estróf.)            (ficha no.: 2772)

Versión de Fazenda das Flores (isla de As Flores, Açores, reg. Açores, Portugal).   Recitada por Jerónimo Gonçalves Trigueiro (72a). Recogida en Stoughton, Massachusetts por Manuel da Costa Fontes, 24/02/1978 (Archivo: ASF; Colec.: Fontes NI 1978). Publicada en F.E.R. L-B Nova Ing. 1980, nº 226. Reeditada en Costa Fontes 1997b, Índice Temático (© HSA: HSMS), pp. 242-244, T4.  188 hemist.  Música registrada.

     Uma história vou contar    que me contou as senhoras Martas:
  2   um soldado a ouvir missa    por um baralho de cartas.
     E podem acreditar    que isto aconteceu;
  4   nada ganhava em mentir    quem estes versos escreveu.
     Quem não anda nada sabe,    pouco pode aprender;
  6   pois o que se passou,    o que os versos vão dizer,
     foi passado num domingo;    estava o regimento inteiro.
  8   Pois um caso igual a este    creio que foi o primeiro.
     Estava com todo o respeito    quando tudo ajoelhou;
  10   um soldado muito sério    um baralho de cartas puxou.
     Com elas se adevertia,    não precisava parceiro;
  12   fingia que estava jogando    com mais outro companheiro.
     Era tal bater cartas    que fazia u~a estalada;
  14   ele, todo sério e sisudo,    não lhe lembrava mais nada.
     Por ser dentro da igreja    ficou tudo ademirado,
  16   mas para o fim vão ouvir    a lembrança do soldado.
     O sargento quando tal viu    as cartas mandou guardar;
  18   ele fez-se surdo e mudo    e continuou a jogar.
     Regressaram ao quartel,    era um grande batalhão;
  20   o sargento quando chegou    fez queixa ao capitão.
     O capitão quando tal soube    mandou chamar o soldado,
  22   dizendo a toda a pressa:    --Há-de ser bem castigado.
     Venha cá esse maroto,    esse maldito sujeito;
  24   vai sofrer grande desgosto    por ter faltado ao respeito.--
     Chegou ao pé do capitão    com uns modos de cativar:
  26   --Aqui estou, meu capitão;    diz que me quer ainda castigar?
     --Ainda falas em castigo!    Hei-de levar tudo a eito,
  28   não deixar de passar    a tua falta de respeito.
     --Se soubesse a minha vida,    meu senhor capitão,
  30   ia roubar para me dar    e não lhe chamavam ladrão.
     Eu tudo lhe vou contar,    o que sinto no coração;
  32   as cartas me serviam    de livro de oração.
     É assim, meu capitão,    como lhe estou a contar;
  34   por ter falta de dinheiro    não pude o livro comprar.
     Dirá que eu sou finório    com a minha explicação,
  36   mas nas cartas vou rezando    os actos da religião.
     Se acaso me dá licença,    já lhe digo como é;
  38   é bom de tudo em tudo    nós não perdermos a fé.
     --Diga lá, quero ouvir,    não se ponha a empalhar;
  40   eu quero ver a maneira    como me quer enganar.
     --Digo a pura da verdade,    não falo por empalhação;
  42   é por falta de dinheiro    que faço esta devoção.
     Digo ao meu capitão    e a outro qualquer que seja:
  44   o ás representa um só Deus    e também uma só Igreja.
     E assim lhes contarei    pelo que tenho visto;
  46   os dois me representam    duas naturezas de Cristo:
     a divina e a humana,    com tudo me aconselho;
  48   até os dois testamentos,    que é o novo e o velho.
     Os três é as Três Pessoas    da Santíssima Trindade;
  50   veja lá, meu capitão,    se eu estou faltando à verdade.
     E as três potências da alma    e as três virtudes cardeais;
  52   lá no meu pensamento    não pode significar mais.
     Os quatro são os novícios do homem    e os quatro evangelistas;
  54   isto está bem entendido,    nem pelos melhores artistas.
     Os cinco são as cinco chagas    que passou Cristo por nós;
  56   ninguém dirá a maneira,    quem ouvir a minha voz.
     Os cinco, sentidos corporais,    e as cinco cidades abrasadas;
  58   diz a escritura segrada,    porque foi em eras passadas.
     Os seis são os dias da semana    em que Deus formou o mundo;
  60   tudo pela sua mão,    abaixo não há segundo.
     Os sete são os pecados mortais,    deixou-os a todo o vivente;
  62   também muitos veniais,    os pratica toda a gente.
     E as obras de misericórdia,    que são sete corporais,
  64   e no fim formam catorze    com as sete espirituais.
     Ainda os sete têm mais u~a    que me lembra a toda a hora:
  66   significa as sete dores    que teve Nossa Senhora.
     Quando chego a contar oito    lembro-me as bem-aventuranças;
  68   e o dilúvio universal;    não perco as minhas esperanças.
     Vou andando para os nove:    só me lembro os poetas
  70   que enganaram o povo;    que cabecinhas discretas.
     Dez são os dez mandamentos    que nos manda a lei de Deus;
  72   esses que bem os guardarem,    os proveitos são todos seus.
     O rei é o Rei dos Céus    a quem devemos obedecer,
  74   a quem devemos adorar    e nunca nos esquecer.
     E a dama é a rainha,    a Virgem Nossa Senhora,
  76   que, rainha dos céus e da terra,    nos está vendo a toda a hora.
     As cartas têm doze figuras,    nada mais tenho que contar:
  78   significa os doze apóstolos;    isto está bem a acertar.
     Não há mais quem lhas diga;    veja lá, meu capitão,
  80   a maneira que as cartas    são os meus livros de oração.
     --Já vejo que és esperto,    és um discreto rapaz;
  82   conta bem, que ainda deixastes    uma das cartas atrás.
     --Eu bem sei: é o valete    ò o burro, como lhe chamamos;
  84   quando lhe ponho a albarda    muito bem o carregamos.
     O valete é a valentia    que tem o meu capitão;
  86   tem força como nenhum    para aguentar um cidadão.
     O valete é o burro,    são os nomes que lhe dão;
  88   mas é só uma figura,    ela mesmo, meu capitão;
     o burro, meu capitão,    se acaso me dá licença,
  90   significa o sargento    que me trouxe à sua presença.--
     O capitão gostou muito    do rapaz assim falar,
  92   ficando muito contente    e não o foi castigar.
     Deu-lhe um mês de licença    para ele ir passear,
  94   nem por muito aprender,    nem por por muito estudar.

Nota del editor: «Lido por Jerónimo... de um caderno que escreveu há muitos anos». Título original: O BARALHO DE CARTAS (ESTRÓF.) Véase A[arne]T[hompson] 1613.

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