0747:1 Flora abandona a su primo (estróf.) (ficha no.: 2760)
Versión de Açores s. l. (Açores, reg. Açores, Portugal). Recogida por Theóphilo Braga, (Colec.: Braga, T.). Publicada en Braga 1982, Cantos, 35. Reeditada en Costa Fontes 1997b, Índice Temático (© HSA: HSMS), p. 224-226, S18. 184 hemist. Música registrada. |
--Bem-vindo sejas, sobrinho, sobrinho meu muito amado; | |
2 | muito folgo de vos ver a esta casa chegado. |
Com esta vossa chegada estou cheio de prazer; | |
4 | dai-me p`ra cá essas cartas, que eu as quero ir ler. |
Entrai e ide falar à vossa tia e à prima, | |
6 | que hão-se gostar de ver-vos e estimar a vossa vinda. |
--As mãos vos beijo, senhoras, os céus vos queiram guardar; | |
8 | sois vós minha prima Flora a quem tanto ouço gabar? |
--Eu é que sou a Flora, eu é que sou essa tal, | |
10 | mas a fama não condiz à pessoa natural. |
Vinde tomar gasalhado, que vos será importante; | |
12 | haveis de vir mui cansado de um caminho tão distante.-- |
Gasalhado foi tomar numa sala mui brilhante, | |
14 | ao pé donde Flora ia a falar ao seu amante. |
Flora se preparou com seu lenço de volante, | |
16 | e, como era de costume, foi falar ao seu amante. |
--Flora, minha Flora, minha Flora querida, | |
18 | contigo quero falar uma vez por despedida. |
Outros amores te ocupam, tu amas com afeição; | |
20 | em casa tens já morando quem te rouba o coração. |
--Quem te disse que eu amava a Félix com afeição? | |
22 | Meu amor sempre foi firme, não muda minha eleição. |
--Decerto mudas, Flora, eu to direi verdadeiro, | |
24 | que em má hora entrou em casa aquele homem forasteiro. |
--Que importa ele em casa assista se o meu amor está fora, | |
26 | se o meu coração é teu, que assim mo diz toda hora? |
--Ninguém se deve fiar em palavras de mulher; | |
28 | elas mudam como o vento, firme só em quanto quer. |
--Não passes mais adiante, que te não posso ouvir; | |
30 | fazes-me dobrar a pena, não me posso despedir. |
Adeus, meu cravo rosado. --Adeus, minha branca flor; | |
32 | adeus, jóia do meu peito, adeus, meu lindo amor. |
--Ouvi-me, senhor, ouvi-me o que vos quero dizer, | |
34 | para evitar certas coisas que possam acontecer. |
Estava na minha cama, estava eu já deitado, | |
36 | ouvi uma voz mui doce àquele muro chegado. |
Levantei-me de repente para me certificar; | |
38 | nas varandas das janelas me fui pôr a escutar. |
Era minha prima Flora mais o seu belo amado, | |
40 | que lhe falava de amores naquele muro encostado. |
Por pouco tempo falaram, mas em carícias de amor, | |
42 | e do coração de Flora ele está possuidor. |
--Ainda que minha filha amores queira tomar, | |
44 | dará a mão a seu primo, ou seu sangue derramar. |
--Não vos convém, senhor, partir tão acelerado; | |
46 | o casamento de Flora não está ainda ultimado. |
Saindo nós desta terra, procurando outra nação, | |
48 | o coração de Flora talvez perca esta afeição. |
--Ó Flora, ó Flora, trata de te preparar, | |
50 | que às quatro horas da tarde nos devemos embarcar. |
--Que partida, senhor, é esta, sem nada se me dizer? | |
52 | Ainda a uma criada não se deve isto fazer. |
--Também eu, com ser mais velho, não sei tudo à vontade; | |
54 | não me pediste conselho, sendo de menor idade. |
Caminha, Dona Flora, são horas de embarcar; | |
56 | pela tua má cabeça terra alheia vou andar. |
--Ainda que meu pai me mate, me chegue à sepultura, | |
58 | nunca deixo o meu amor, com ele é minha ventura. |
Que partida tão cruel, com tanta aceleração! | |
60 | Cá me fica o meu amor, eu vou morrer de paixão.-- |
O pai disse p`r`à companha: --Os músicos toquem, que vão | |
62 | para alegrarem a Flora de sua triste paixão. |
--Principiemos tocando a nossa moda do mar: | |
64 | quem ama sem reflexão vem a ter grande pesar. |
--Ó coração magoado, mais triste que a noute escura; | |
66 | melhor fora que este mar fosse minha sepultura.-- |
O filho faltou em casa, o pai o foi procurar; | |
68 | foi dar com ele no muro, como um velho, a caducar. |
--Que tens, meu amado filho, que a vida te faz perder? | |
70 | --Perdi minha amada Flora, não a torno mais a ver. |
--Foram numa romaria, eles não devem tardar; | |
72 | devemos dar tempo ao tempo, o tempo se deve esperar. |
--Senhor, não digais isso, porque não me dá contento; | |
74 | o seu fim foi estorvar fazer-se o meu casamento. |
--Corta já os teus cabelos, de peles nos vestiremos; | |
76 | correndo por toda a terra Flora descobriremos.-- |
Embarcaram pai e filho, correram tudo por ela; | |
78 | passando por certa rua Flora viram à janela. |
--Diga-me, senhor, donde é, eu o quero conhecer, | |
80 | e será da minha terra, se dela se quer esquecer. |
Eu nasci na mesma terra onde o amor vi nascer; | |
82 | sou de partes da Hungria, fugindo quero morrer. |
--Essas partes da Hungria hão-de ter muito que ver, | |
84 | pois as do Norte são frias, enfadonhas no viver. |
--A terra onde nasceu muito o fez esquecer; | |
86 | o amor que lhe fugiu não o sabe conhecer. |
--O amor que me fugiu eu bem o sei conhecer, | |
88 | mas, se ele me é firme, isso não posso dizer. |
--Suba, senhor, cá p`ra cima, que o quero receber, | |
90 | e fujamos desta terra onde eu estou sem querer. |
Acudam, senhores, acudam, justiça deste lugar; | |
92 | os meus primeiros amores no coração têm lugar.-- |
Nota del editor: Os versos 91-92 também se encontram em A Volta do Navegante (I9) [Vuelta del navegante 0559]. Título original: FLORA (ESTRÓF.). |