Pan-Hispanic Ballad Project

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2865:1 A Pastora (á-a)            (ficha no.: 2698)

Versión de Algarve s. l. (dist. Faro, Algarve, reg. Algarve, Portugal).   Recogida por S. P. M. Estácio da Veiga, publicada en Veiga 1870, Romanceiro do Algarve, pp. 143-47. Reeditada en Costa Fontes 1997b, Índice Temático (© HSA: HSMS), pp. 161-162, K12.  132 hemist.  Música registrada.

     ****--Que fazeis aqui, senhora,    tão gentil e delicada,
  2   com chapelinho à maltesa,    saia de lã recortada?
     Quem pelos endros da serra    anda assim tão bem trajada,
  4   ou é princesa dos bosques    ou donzela enamorada.
     Dizei, dizei, donzelinha,    onde é vossa albergada;
  6   embora longe ela seja,    lá mesmo sereis levada.
     Se pai e mãe `inda tendes,    eles me darão pousada,
  8   que já minh` alma não pode    andar de vós apartada.
     Cativaram-me esses olhos    e as vossas faces rosadas,
  10   renderam-me os vossos cantos    quando los eu escutava
     junto às margens da ribeira    em que vos vira assentada.
  12   --Deixai-me, senhor, deixai-me    andar só por esta estrada,
     que a pastora que aqui vedes    anda alegre e bem cuidada.
  14   Não é princesa dos bosques    nem donzela enamorada,
     vive feliz sem amores,    com amores não tem nada.
  16   Saí, saí destas selvas,    que aqui não achais pousada.
     --Não me aparto, não, donzela,    antes que venha a alvorada;
  18   Já que vos vi tão louçana,    haveis de ser adorada.
     --Não me enganam vossos olhos    nem vossas doces palavras;
  20   amor assim não se cria    numa hora tão minguada.
     Ai, não vos quedeis, senhor,    vos rogo por vossa alma.--
  22   A donzela assim pedia,    e a pedir bem que chorava;
     rendida, já tão rendida    estava a triste, coitada.
  24   Cavaleiro, que isto ouvia,    não mais que suspiros dava,
     até que mais não podendo    em seus braços a estreitava.
  26   Já não resiste a donzela,    nem já pranto derramava.
     Tudo é brandura; o receio    todo em amor se tornava.
  28   Dali se parte o mancebo    com pensar que `inda voltava,
     e do peito da donzela    uma rosa lhe levara.
  30   Indo pela estrada avante    mal que via a mesma estrada,
     que a noite vinha tão negra    que a muito custo enxergava.
  32   Lá em meio do caminho    grande traição era armada:
     perro vilão sai-lhe à frente,    de lado a lado o varava.
  34   Cai por terra o cavaleiro    e morto ali se quedara.
     O vilão, que morto o vira,    atrás logo se voltara,
  36   trazendo na mão a rosa    que o cavaleiro levara.
     Acabada a negra noite    o novo dia alvorava;
  38   a pastora, com amores,    em vez de dormir sonhava.
     Mal o sol era a romper    já ela vinha toucada.
  40   Desce à margem da ribeira    e, entre flores assentada,
     lembram-lhe ali as venturas    que pouco antes gozara,
  42   e ao som d` água que corria    estas saudades cantava:
     --Onde estarás, cavaleiro,    alma de mim tão cuidada,
  44   que não vens matar saudades    que me cá deixaste n` alma?
     Onde estão esses teus olhos,    onde está tua palavra,
  46   que juraste ser voltado    logo ao raiar d` alvorada?
     Ai pobre da minha vida,    ai pobre de mim, coitada;
  48   mal começo a ter amores,    eis-me triste e desgraçada!--
     Junto de uma alfarrobeira    o perro vilão estava;
  50   quantas mágoas mais ouvia,    bem mais ele se enraivava.
     Amava ele a pastora    e, como ela o não amava,
  52   por vingar-se dele e dela    esta nova assim lhe dava:
     --Senhora, minha senhora,    porque estais tão magoada?
  54   Se chorais só pela rosa    que há pouco vos foi roubada,
     ei-la aqui; no vosso peito    seja de novo guardada.
  56   Cavaleiro que a roubou    já com a vida a pagara;
     mal lhe tocou este ferro,    logo em terra se quedara.--
  58   Ela, ouvindo uma tal nova,    quer falar, porém não fala;
     foge-lhe a luz d` ante os olhos,    dá-se em terra desmaiada.
  60   O vilão, que assim a vira,    jurou de não mais amá-la.
     Como em sinal de desprezo,    ei-lo que vai de abalada,
  62   deixando-lhe sobre o peito    a rosa, mas desfolhada.
     Dizem que a triste donzela    por morta logo ficara,
  64   e que passado algum tempo    mesmo ali a soterraram,
     que sobre a cova nascera    uma roseira encarnada,
  66   e que as rosas, que eram muitas,    toda a serra perfumavam.

Nota: ****Como señala C. F. al colocar el asterisco delante del título, se trata de una invención de un poeta romántico, imitando el estilo popular.

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