|
--Meu padre cura, que eu rezar não sei; |
2 |
fui à confissão, não me confessei. |
|
--Não te confessaste, onde não hás-de ir? |
4 |
És um penitente, Deus há-de acudir. |
|
--Deus há-me acudir, não o sei dizer, |
6 |
que me não ensina que lhe hei-de fazer. |
|
--Que lhe há-des fazer? Dizes muito bem. |
8 |
Dize-me, pastor, dize donde vens. |
|
--Ó meu padre, eu venho c` o suor em bica; |
10 |
tudo me ensinaram, eu nada me fica. |
|
--Não te fica nada, o teu corpo sente.-- |
12 |
(Já me está mentindo este penitente. |
|
Este penitente eu vou desculpando:) |
14 |
--Tu d` hoje em diante já hás-de ir rezando. |
|
--Já hei-de ir rezando. --Palavra me destes; |
16 |
o que tu querias é safar-te desta. |
|
--Safar-me desta, bem dizia eu; |
18 |
padre como este ainda cá não veio. |
|
--Ainda cá não veio tão bonito caso! |
20 |
Dize-me, pastor, o mal que t` eu faço. |
|
--O mal que me fazes não é nada bom; |
22 |
confessar ao padre, direi que é bem bom. |
|
--Dirás que é bem bom, cabeça de vento, |
24 |
confessar as freiras dentro do convento. |
|
--Dentro do convento faço sentinela; |
26 |
meia-noute à noute, eu durmo com ela. |
|
--Dorme com ela, ninguém te acoite; |
28 |
dize-me, pastor, que fazes à noite. |
|
--Meu padre cura, são coisas sem dono; |
30 |
deito-me na cama porque tenho sono. |
|
--Isso não é sono, é grande priguiça; |
32 |
dize-me, pastor, se assistes à missa. |
|
--Ó meu padre cura, qu` eu não te engano; |
34 |
assisto à missa uma vez no ano. |
|
Uma vez no ano porque sou pastor; |
36 |
eu vigio o gado, que é do meu amor. |
|
--Ajoelha, pastor, dize a confissão. |
38 |
--Frechada de leite, dentada de pão.-- |