Pan-Hispanic Ballad Project

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2972:1 O Chapim de el-Rei (estróf.)            (ficha no.: 2765)

Versión de Portugal s. l. (Portugal).   Documentada en o antes de 1853. Publicada en Almeida Garrett 1963 I, 173-182. Reeditada en Costa Fontes 1997b, Índice Temático (© HSA: HSMS), p. 229-235, S23.  224 hemist.  Música registrada.

     ****Verdes parras tem a vinha,    ricas uvas nela achei,
  2   tem maduras, tão coradas . . .    Estão dizendo «comei!»
     «Quero saber quem nas guarda;    ide, mordomo, e sabei.»
  4   Disse o rei ao seu mordomo.    Mas porque o dizia o rei?
     Porque viu naquele monte    e como ele o viu não sei;
  6   essa dona emparedada,    não se sabe por que lei,
     que por seu mal é condessa,    Condessa de Valderei:
  8   antes ser pobre e vilão,    antes, pela minha fei!
     Verdes parras tem a vinha:    uvas que lhe vira el-rei
  10   tão maduras, tão coradas,    estão dizendo «comei!»
     Veio o mordomo do monte:    --Boas novas, senhor rei!--
  12   A vinha anda bem guardada,    mas eu sempre lá entrei.
     O dono foi-se a outras terras,    quando voltará não sei;
  14   a porta é velha, e a porteira    com chave de ouro a tentei.
     Serve a chave à maravilha,    tudo por fim ajustei:
  16   esta noite, à meia-noite,    convosco à vindima irei.
     --Valeis um reino, mordomo,    grandes mercês vos farei:
  18   esta noite, à meia-noite,    ricas uvas comerei.--
     A vinha tem parras verdes,    madura a uva lhe achei;
  20   e tão madura, tão bela,    que está dizendo «comei!»
     Ao pino da meia-noite    foi mordomo e foi o rei:
  22   doblas que deram à velha,    um conto que nem eu sei.
     --Mordomo ficai à porta,    à porta que eu entrarei;
  24   não me saltem cães na vinha    enquanto eu vindimarei.--
     A porteira o que lhe importa    é o dá-me que te darei . . .
  26   No camarim da condessa    veis agora entrar o rei.
     Leva um candil aceso;    era de prata, sabei;
  28   não há senão prata e oiro    na casa de Valderei.
     Da vinha as parras são verdes,    as uvas maduras sei,
  30   são tão coradas, tão belas. . .    Delas quando comerei!
     No camarim da condessa    tudo andava à mesma lei,
  32   era o céu daquele anjo:    que mais vos diga não sei.
     Ricas sedas de Milão,    toalhas de Courtenei . . .
  34   Tremia o rei - se era susto,    se era de gosto não sei.
     Cortinas de seda verde    vai ergo não erguerei . . .
  36   Tal clarão lhe deu na vista,    como não caiu não sei.
     Era uma tal formosura . . .    Ora que mais vos direi?
  38   Outro primor como aquele    não vistes nem eu verei.
     Verdes parras tem a vinha,    ricas uvas lhe avistei,
  40   tão formosas, tão maduras,    estão dizendo «comei!»
     Dormia tão descansada    como eu no céu dormirei
  42   quando for tão inocente . . .    Jesus! se eu lá chegarei!
     De joelhos toda a noite    ali fica o bom do rei,
  44   pasmado a olhar para ela    sem bulir nem mão nem pei.
     E dizia: --Senhor Deus!    Perdoai-me o que já pequei,
  46   mas este anjo de inocência    não sou eu que ofenderei.--
     Tem verdes parras a vinha;    lindas uvas que eu lhe achei,
  48   tenho medo que me travem . . .    Delas, ai! não comerei.
     Já vinha arraiando o dia,    e ele, como vos contei,
  50   ouve apitar o mordomo . . .    --Jesus, Senhor, me valei!--
     Era o sinal ajustado    --Vindo o conde, apitarei--
  52   deixou cair as cortinas    dizendo: --Não vindimei!--
     Lindas parras tem a vinha,    belas uvas nela achei;
  54   mas doeu-me a consciência,    das uvas não comerei.
     Deita a correr com tal pressa    que voava o bom do rei:
  56   «Ai que perdi um chapim . . .»    --Tomai, que um meu vos darei.--
     Mas nem um instante mais,    que o conde já avistei,
  58   descendo daquela altura;    se nos colherá não sei . . .
     Era o medo do mordomo:    outro era o medo do rei.
  60   Qual deles tinha razão    agora vo-lo direi.
     Parras verdes viu na vinha,    uvas maduras de lei;
  62   foi travo da conciência,    diz: --Delas não comerei.--
     Chega o conde à sua torre,    o Conde de Valderei.
  64   Topou num chapim bordado . . .    Como ficou não direi.
     Vai-se ao quarto da condessa:    --Morrerá, matá-la-ei.--
  66   Viu-a dormir tão serena:    --Jesus! Não sei que farei.--
     Corre a casa ao derredor:    --Deus me tenha em sua lei,
  68   que ou esta mulher é bruxa    ou eu c` o chapim sonhei!--
     O chapim aqui o tenho,    o chapim bem no topei . . .
  70   Mas que durma assim tão manso    quem tal fez, não no crerei.
     Entrou a cismar naquilo:    --Valha-me Deus, que farei?--
  72   Por menos fica homem doido;    e eu como o não ficarei?
     Minha vinha tão guardada!    Uvas que nela deixei
  74   não é fruta que se conte . . .    Da que me falta não sei.
     Foi-se fechar no mais alto    da torre de Valderei:
  76   --Não quero comer do pão,    nem do vinho beberei;
     Minhas barbas e cabelos    também mais os não farei;
  78   que esta verdade não saiba    daqui me não tirarei.--
     Verdes parras dessa vinha,    uvas que eu não comerei,
  80   ficai-vos secas embora,    que eu já` gora morrerei.
     Por três dias e três noites    que se guarda aquela lei;
  82   clama a triste da condessa:    --Ao seu mal que lhe farei?--
     De quem foi ela valer-se?    Agora vo-lo direi.
  84   Foi lastimar-se a inocente . . .    Onde iria? --Ao próprio rei.--
     --Ide, condessa, ide embora,    que eu remédio lhe darei;
  86   o segredo do seu mal    sei-o eu . . . Se o saberei?
     Palavra de cavaleiro    em lealdade vos darei,
  88   que ou ele há-de ser o que era,    ou eu, quem sou, não serei.
     As verdes parras da vinha,    as uvas que eu cobicei,
  90   elas a travar-me n` alma . . .    E mais delas não provei!
     Fora dali a condessa,    não tardou em ir o rei:
  92   --Quero ouvir o que eles dizem,    a esta porta escutarei.--
     Ouviu uma voz celeste    como tal nunca ouvirei,
  94   cantando em doce toada    este triste virelei:
     --Já fui vinha bem cuidada,    bem querida, bem tratada:
  96   como eu medrei!    Ora não sou nem serei:
     O porquê não sei    nem no saberei!--
  98   Com as lágrimas nos olhos    foi dali o bom do rei:
     --Oiçamos agora o outro,    e o que sabe, saberei!
  100                                     --Minha vinha tão guardada!--
     Quando nela entrei    rastos do ladrão achei;
  102   se me ele roubou não sei:    como o saberei?
     Era o conde a lastimar-se.    Sorrindo dizia o rei
  104   (se era de si ou do conde    que ele se ria não sei):
     --Eu fui que na vinha entrei,    rastos de ladrão deixei,
  106   parras verdes levantei,    uvas belas nelas vi:
     e assim Deus me salve a mi    como delas não comi!--
  108   A porta tinha uma fresta:    tirou o chapim do pei,
     atirou-lho para dentro,    disse-lhe: «Vede e sabei».
  110   Do mais que ali sucedeu    para que vos contarei?
     O conde soube a verdade,    e o rei soube ser rei.
  112   Verdes parras tem a vinha,    ricas uvas lá deixei:
     quem ma guardou foi o medo . . .    de Deus e da sua lei.

Nota: ****Una vez mas (según advierte el asterisco delante del título), se trata de un romance inventado por un autor romántico, quien pretendía imitar el estilo popular.
Nota del editor: Em última análise, este romance baseia-se na história do "Leão" do Sendebar. V. John E. Keller, El libro de los engaños, pp. 7-8; Morris Epstein, Tales of the Sendebar, pp. 92-101; e o importante estudo de T. Anthony Perry, `La huella del león` in Spain and in the Early Sindibad Tales".] Véase: A[arne]T[hompson] 891B***
Hay una especie de estribillo variable -- "Verdes parras tem a vinha . . ." --que se repite cada 3, 4 o 5 estrofas.
Título original: *O CHAPIM DE EL-REI OU PARRAS VERDES (ESTRÓF.)

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